Eu não vou enganar ninguém, não. Não necessariamente escolher não ter filhos vai tornar sua vida mais fácil – pode ser até “mais simples”, mas se eu disser que é fácil passar raiva com gente sem noção eu estarei mentindo. Na nossa sociedade, não ter filhos não é nem um pouco fácil. Se você já fez essa opção, sabe do que estou falando; se ainda está se decidindo, esteja preparada (o): você vai ser questionado e criticado todos os dias por esta escolha. Não vou ser hipócrita. É por isso que, infelizmente, muitas pessoas acabam sucumbindo à pressão.
Nesta sociedade de merda patriarcal, ser a gente mesmo é um ato de rebeldia. É preciso ter muita coragem para optar por uma vida não normativa (é como andar na contramão de uma via movimentada). Em algum momento, temos que “sair do armário” e nos revelarmos para a família e amigos. É como se fôssemos os novos homossexuais – guardadas as devidas proporções, claro (já que não corrermos o risco de sermos espancados na rua).
Não é fácil ter que se justificar o tempo todo e não ser levado a sério, ouvir dizer que “é uma fase” e “você é muito nova(o), vai mudar de ideia”. Não é fácil sentir o olhar de desprezo ou pena, como se fôssemos vítimas de alguma deficiência física ou mental. Não é fácil quando nos perguntam se é por algum problema de saúde (como se fosse impossível desejar não ter filhos de verdade, a não ser por uma enfermidade). Não é fácil ser visto como esquisito, doente, frio mesquinho. Não é fácil acharem que você é uma bruxa que come crianças com batata no jantar.
Se você estiver pensando em nunca ter filhos, precisa estar preparado psicologicamente para lidar com todo tipo de julgamento e esteriótipos. Precisa aprender a não se importar com o que os outros pensam. Precisa entender que o que os outros falam diz muito mais sobre eles do que sobre você (ou os motivos que te levaram a essa escolha).
Vão dizer que você é egoísta, que você nunca vai conhecer o verdadeiro amor e que você vai morrer triste e sozinha(o)… vão te dizer muitas atrocidades e despejar um caminhão de merda mentiras sobre você. Mas a sua verdade deve prevalecer, afinal de contas, ela só diz respeito a você. Ninguém tem nada a ver com sua vida.
Meu conselho é que você se conheça e entenda os motivos que a(o) levaram a optar por não ter filhos, e tome sua decisão de forma consciente – só assim você fará disso uma escolha de verdade: racional, e não emocional. A partir do momento que você se conhecer melhor, vai conhecer melhor suas razões. Eu garanto que assim ficará muito mais fácil rebater as críticas, conviver com os julgamentos, os questionamentos e as dúvidas dos outros quanto à sua idoneidade.
Eu sempre ouvi que “toda escolha envolve uma renúncia”. Às vezes, uma pessoa que escolhe não ter filhos renuncia à sua privacidade (eu já me vi dando justificativas a completos estranhos acerca desse tema), mas uma pessoa que escolhe tê-los, muitas vezes, renuncia a si mesma (metaforicamente, muito já se fala da morte da mulher para o nascimento da mãe).
Mas se este é o preço da minha liberdade, eu pago o que a vida está me cobrando (com juros e correção), pois não só renunciei ao meu direito à privacidade, como ainda publicizei minha opção para fomentar este debate tão necessário. Como já disse antes: isso já não é mais sobre mim, é sobre uma legião de pessoas que precisam de acolhimento por terem passado a vida inteira se sentindo verdadeiros ETs!
Perfeito! Estou nessa de decidir, pois estou com 37 e a pressão é grande! Nunca tive muita vontade de ser mãe, me identifiquei com seus textos. Tem muita gente chata dando pitaco, mas só a gente deve decidir isso.