Crianças,Maternidade,Sociedade Quando a apologia à maternidade compulsória passa dos limites

Quando a apologia à maternidade compulsória passa dos limites

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Não tinha como não falar disto aqui: o caso da menina de 10 anos que foi estuprada pelo tio e engravidou. Mesmo a lei prevendo o aborto legal em caso de estupro, o procedimento foi negado no hospital de Vitória (ES) e, para garantir o acesso a um direito básico (previsto em lei e autorizado pela justiça), ela precisou viajar com a avó, para o Recife. O hospital onde ela foi atendida quase foi invadido por fundamentalistas “pró-vida”, que, aos gritos, hostilizavam a menina e a equipe do hospital.

O médico que realizou o procedimento precisou sair escoltado. O diretor do hospital já foi excomungado pela Igreja Católica por realizar, no passado, o aborto de uma menina de nove anos, grávida do padrasto. Sim, é isso mesmo que você leu: a mesma Igreja que acoberta inúmeros abusos (de meninas e meninos) excomungou um médico que estava cumprindo a lei.

A justificativa de quem estava defendendo a continuidade da gestação era de que “assassinato é crime”. Pois bem: pedofilia também é crime e a vida dessa criança violentada também importa. Não vi essas pessoas pedirem a prisão do único criminoso da história. Li comentários na internet defendendo a continuidade da gestação sugerindo, como alternativa, a adoção do bebê. Por que será que estavam defendendo a vida de um feto, concebido através de um estupro de vulnerável, mas nenhum desses fundamentalistas estava preocupado com a vida dessa criança indefesa, que talvez nem sobrevivesse a uma gestação/ parto? A nossa sociedade é tão pró-natalidade, que estavam querendo obrigar uma criança a viver a maternidade (isso sem mencionar os comentários irracionais de pessoas “cristãs” sugerindo que, se a menina nunca falou nada durante esses quatro anos de abuso, era porque “ela gostava” das “carícias” daquele pervertido).

Eu não quero nem imaginar o que essa criança passou e está passando, pois já acho uma violência quando a sociedade impõe a maternidade a uma mulher madura, mas sugerir que maternidade infantil é algo plausível já é absurdo demais. Estamos presenciando um surto coletivo. Estamos vivendo em uma era em que as pessoas defendem que aborto em caso de estupro é inaceitável, mas pedofilia parece ser aceitável, da mesma forma que acabar com a vida de uma criança (que já teve 40% da sua vida devastada), obrigando-a a ser mãe na infância (repito: NA INFÂNCIA), é defendido em protestos por pessoas que se dizem “cidadãos de bem”.

O Sem Filhos é um projeto que surgiu após a leitura de um livro que aborda vários problemas acerca da maternidade compulsória e das consequências devastadoras que isso gera na vida de mulheres que não queriam ser mães. É uma agressão bizarra e a sociedade alimenta isso de várias formas, começando por não respeitar a opção de mulheres que não querem ter filhos, pressionando-as a tê-los a qualquer custo, minimizando ou invalidando suas razões para não querer isso, e culminando com esse tipo mais covarde de apologia à maternidade compulsória, que acabamos de presenciar neste final de semana: a maternidade compulsória infantil.

Está na hora de darmos um basta! Parafraseando uma amiga minha: a sociedade precisa aprender a deixar as mulheres em paz!

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